terça-feira, 20 de maio de 2008

Lua, Lua Cheia...

Desenho de Eduardo Uchôa-ZH


Ah, noites lindas de veranicos de maio,
noites frescas e amoráveis,
noites donzelas de se deitar sobre um tapete
nas alturas de um terraço
e sentir o perfume das flores que se escancaram pro calor....
Os dois botões de rosa sorrindo pra calidez da noite.
As pétalas suaves rosadas da azaléia,
Ali, no cantinho do amor do terraço,
vindo a mil,
esvoaçantes,
risonhas,
e escancaradas....
como se estivessem me saudando em alegrias!
As ipoméias enredaram-se por um fio obtuso,
esquecido na sua inutilidade,
e agora por todas as manhãs,
colorem-se de campânulas roxas
brilhantes ao sol.

O verde profuso se espalha
Por escadas,
Madeiras, muros e pedras, cercas, arames
Ah, meu verde tão destroçado,
Vigora agora
Incansável
E copioso.

E o vinho fresco,
gelado,
companhia serena.
depois de um dia duro
de muito trabalho,
de malhação,
de ferrenho labor,
de colheita,
de semeaduras ...

Ah, noites lindas de veranicos de maio,
Mais parecem aquelas doces noites
De eternas noites
De seco nordeste...


20/05/08

sábado, 17 de maio de 2008

Barco sem Rumo




Sou uma de tuas bonecas
que jogas pro lado
arrancas um braço
e torces o cabelo.
Sou eu uma teia
na qual te emaranhas
e te perdes em mim.

Sou eu um de teus tapetes
teu capacho que deitas
e rola, geme e se encolhe
sem entender por quê.

Sou eu tua música que voa solta
e vaga deserta esbarrando em árvores.
Sou teu barco sem rumo
sem amanhã, sem depois
sem açúcar, sem feijão.

Sou eu teu periscópio
que catas à noite
pedaços de estrelas
sonhos de lua
um pouco de paixão
um beijo molhado.

Sou eu teu porta-alfinetes
teu traveseiro
teu corpo suado
querido e devasso.
Sou eu um dos teus livros
que abres sem pressa
sem angústia
com carinho
e te delicias
em cada folha
em toda letra.

Sou eu teu guarda-chuva,
tua gaveta, teu colchão,
teu bicho selvagem
tua mata cascata riso ternura...

Sou eu tua bruxa tua maga tua gênia tua fada
tua estrela...
(Para o Renato, um gênio no piano)



Do terreno


A gente faz de conta
Que a vida continua
E vai regar os tomates....

1982

Memórias


Àquele que nunca nasceu

Àquele que nunca morreu

Àquele que nunca aconteceu.

Àquele que um dia eu encontrei

Intensamente,

Àquele que fez a vida e a poesia
Que trouxe o sol

E espantou a madrugada;

Àquele que se fez deus

E me fez chorar;
Àquele que trouxe as estrelas

E fez do casebre a realeza

Que trouxe a chuva, o orvalho, o canto, a alegria

A doce alegria das crianças,

A doce loucura da criança...

Àquele que com seu braço branco

Nunca me chegou.

1981


sábado, 10 de maio de 2008

Anjos

Picasso

Ai, com que doçura que elas foram chegando! Vieram como uma legião, uma turba, e eu, carente de momento, nem sabia que tinha tantos seres à minha volta...

Chegavam como cândidas asas angelicais dando conforto, palavras doces, olhares meigos, abraços cálidos...

Às vezes vinham aos pares, tais como asas de borboletas, adentrando pela porta principal, trazendo doçura, apoio, palavras amigas, doces apertos de mão e lenços invisíveis enxugando as minhas lágrimas.

Que seria eu sem esses anjos? Que valor eles têm e que só se revelam na nossa hora de aperto, de dor, de sufoco, de tristeza, de dor mais funda...?

Há aqueles outros anjos que não puderam me afagar com suas presenças, mas de longe me acariciaram, me mandando boas emanações, palavras de coragem, beijos cibernéticos.

Outros de mãos mágicas me curaram, me acariciaram, outros serviram vinho, fizeram jantinha, me cobriram pra melhor dormir...

Alguns estavam tão distantes... meses sem contato, sem tempo, o trabalho, a correria, a vida agitada de cidade grande, tudo afasta, mas bastou a dor e eles chegaram, sem nem pedir licença...foram chegando e se fazendo presentes.

Ah, meus anjos, minhas amigas, quando eu estiver bem longe daqui, noutro plano, ou neste, quem sabe, estarei ali, pertinho de vocês... fazendo o mesmo !

terça-feira, 6 de maio de 2008

La Marioneta




Se, por um instante, Deus se esquecesse de que sou uma marionete de trapo e me presenteasse com um pedaço de vida, possivelmente não diria tudo o que penso, mas, certamente, pensaria tudo o que digo।
Daria valor às coisas, não pelo que valem, mas pelo que significam.
Dormiria pouco, sonharia mais, pois sei que a cada minuto que fechamos os olhos, perdemos sessenta segundos de luz. Andaria quando os demais parassem, acordaria quando os outros dormem. Escutaria quando os outros falassem e gozaria um bom sorvete de chocolate.
Se Deus me presenteasse com um pedaço de vida, vestiria simplesmente, me jogaria de bruços no solo, deixando a descoberto não apenas meu corpo, como minha alma.
Deus meu, se eu tivesse um coração, escreveria meu ódio sobre o gelo e esperaria que o sol saísse. Pintaria com um sonho de Van Gogh sobre estrelas um poema de Mario Benedetti e uma canção de Serrat seria a serenata que ofereceria à Lua. Regaria as rosas com minhas lágrimas para sentir a dor dos espinhos e o encarnado beijo de suas pétalas.
Deus meu, se eu tivesse um pedaço de vida. Não deixaria passar um só dia sem dizer às gentes – te amo, te amo. Convenceria cada mulher e cada homem que são os meus favoritos e viveria enamorado do amor.
Aos homens, lhes provaria como estão enganados ao pensar que deixam de se apaixonar quando envelhecem, sem saber que envelhecem quando deixam de se apaixonar. A uma criança, lhe daria asas, mas deixaria que aprendesse a voar sozinha.
Aos velhos ensinaria que a morte não chega com a velhice, mas com o esquecimento. Tantas coisas aprendi com vocês, os homens…
Aprendi que todo mundo quer viver no cimo da montanha, sem saber que a verdadeira felicidade está na forma de subir a escarpa.
Aprendi que quando um recém-nascido aperta com sua pequena mão pela primeira vez o dedo de seu pai, o tem prisioneiro para sempre. Aprendi que um homem só tem o direito de olhar um outro de cima para baixo para ajudá-lo a levantar-se.
São tantas as coisas que pude aprender com vocês, mas, finalmente, não poderão servir muito porque quando me olharem dentro dessa maleta, infelizmente estarei morrendo.
Johnny Welch

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Homem Azul


Meu homem azul
Desbotou
Com o tempo.
Esmaeceu com a chuva
Encolheu com o sol.

Meu homem azul
Que era todo o mundo
Todo espaço
Todas as estrelas
Todas as cadentes
Todas as tangentes
Todos os meridianos
da terra!

Meu homem azul
Em que espaço
Foste parar?
Em que galáxia?
Em que umbral.
Em qual inferno
de Dante
chegaste
aterrissar?

Ah, meu homem azul
nem morrendo
te encontrar
de novo
eu quero!
31/12/07